Entrevista publicada no DIARINHO de 10 de janeiro de 2009.
“O limite da notícia é a verdade”
Como foi crescer tão próximo de um jornal que até hoje causa polêmica? O que as pessoas (colegas e professores) comentavam quando você era criança, sendo que o jornal já utilizava esta linguagem que lhe é peculiar?
Ana Claudia Dalagnoli, 26 anos, jornalista.
Cresci achando o jornal interessante, porque é um lugar interessante para uma criança. Tinha muitas pessoas, movimento, novidade, naquela época ainda tinha uma gráfica. Quando eu ia visitar o meu pai, o meu avô na redação era um motivo de alegria e satisfação. Era um lugar onde eu gostava de levar minhas amigas, de participar do dia-a-dia do jornal. Na escola, eu sempre fui uma criança tímida, nunca falei “olha, sou a neta do dono do DIARINHO”, mas em algum momento alguém descobria e comentava. Às vezes, com um tom crítico. Às vezes, com admiração, mas nunca passou em branco ser a neta do Dalmo Vieira. [Mas chegou a acontecer alguma cena desagradável?] Tinham professores desagradáveis, que falavam algumas coisas a respeito do jornal e isso me constrangia de alguma forma. Falavam mal do meu avô, que no jornal dele tinha palavrão, essas coisas. Mas com o passar dos anos eu vi que isso era motivo mais de orgulho e satisfação do que pra me incomodar.
Conheço pessoas que vem pra cá e levam o jornal embora pra São Paulo por causa da linguagem. O DIARINHO chega até a ser apresentado em sala de aula, como objeto de estudo. De quem foi a ideia em utilizar esta linguagem? E qual é o objetivo de usar essa linguagem popular e até cômica?
Cristian Resener, 31 anos, fisioterapeuta.
Isso não foi uma coisa estudada. Nem sempre o DIARINHO utilizou uma linguagem popular. Quando isso aconteceu, no começo da década de 80, eu era uma criança, uma menininha. Mas o que o meu avô me falou a respeito, e o que a gente acompanha nas edições da época, é que essa adaptação da linguagem foi uma coisa gradual. O DIARINHO foi o primeiro jornal diário de Itajaí. Num primeiro momento ele tinha uma linguagem, falava com o público de uma forma, e depois, como seria natural, ele foi se sentindo mais à vontade para falar com o seu leitor. E viu que essa nova forma de comunicação tinha mais resultado. Então foi uma coisa do ‘caminhar’ do DIARINHO. Não foi uma coisa de mercado: vamos mudar para vender mais. Foi ter sensibilidade para perceber que trazendo a linguagem que as pessoas falam nas ruas pras páginas do jornal, era uma forma mais eficiente de comunicação.
A partir do terceiro ano de vida ele passou a ter uma linguagem mais solta. Depois teve um período em que ele foi mais ácido, na década de 90. E, então, de uma certa forma, saturou o uso de uma linguagem muito vulgar. Se consolidou o uso da linguagem coloquial, ‘normal’ no dia-a-dia de uma pessoa comum. Pode até largar um palavrão às vezes, como toda pessoa larga, mas não é de maneira vulgar que nos comunicamos. É uma simples, direta e que admite o uso da gíria, do palavrão.
O jornal usa a linguagem com muitas gírias. Às vezes a pessoa que está lendo pode não entender o que significa alguma dessas palavras, um exemplo é malaco, eu não sei o que é.
Pedro Telles, garçom, 40 anos.
O cuidado que a gente tem tido é: tentar se comunicar de uma maneira que as pessoas nos entendam. Eu acho curioso alguém morar aqui e não entender que malaco é bandido. Esta semana eu estava lendo a Veja e reparei que o título da matéria da condenação do Daniel Dantas usava ‘cana’, ao invés de prisão. Eu pensei: “bom, se até a Veja tá falando assim, o DIARINHO então também pode falar..”. Eu acho que malaco, cana, dimenor, essas expressões são bem fáceis de entender. Se a gente não está se fazendo entender em algum momento, acredito que seja uma coisa mais isolada. Mas, de toda a forma, é uma preocupação que eu tenho: que a gente se comunique não com a linguagem usada pela polícia, nem em um bairro específico, mas com a linguagem dos nossos leitores.
Outra coisa que tem que ser observada é que o DIARINHO usa uma linguagem mais regional, especialmente na faixa do litoral norte catarinense. Esta faixa, que começa em Florianópolis e vai até Barra Velha, tem uma cultura específica, um modo de viver parecido. O DIARINHO nasceu e se criou neste espaço. Ele pode e deve ter leitores fora desta área geográfica, mas ele foi pensado e se comunica melhor com o leitor desta faixa do nosso litoral.
Desde a partida do fundador do DIARINHO, Dalmo Vieira, o jornal vem preservando sua principal marca: a linguagem do próprio DIARINHO. Tenho notado, entretanto, que o toque humorístico do jornal ficou mais acanhado. Fale sobre esta observação. Isso era uma particularidade do Dalmo ou passou a ser uma opção da atual redatora chefe?
José Roberto Provesi, 47 anos, reitor da Univali.
Eu acho que o humor é uma coisa muito pessoal. O que pode ser engraçado pra mim, pode não ser pra você e pode ser até agressivo pra fulano, por exemplo. Não é intenção do DIARINHO ser um jornal de humor, ele não é uma sátira de jornalismo. A minha intenção é que ele seja um jornal bem humorado, que ele saiba passar as informações de uma maneira bacana, ou seja, de forma honesta e inteligível, não necessariamente tendo que fazer graça. Acho que tem assunto e tem matéria onde cabe uma pitada de humor, a tirada de sarro, e em outras não, porque ficaria grotesco. Se a gente fizer uma consulta sobre o que é engraçado, vamos achar um monte de opiniões diferentes. Além disso, é natural que o DIARINHO esteja diferente aos 30 anos do que era aos 25, aos 15, porque ele também passou por uma evolução. Mas voltando à questão específica do humor, eu acho que ele continua sendo um jornal muito bem humorado.
Com a morte do seu Dalmo, o que mudou no DIARINHO: a linguagem, a forma de abordar as matérias?
Luciana Alves, 23 anos, vendedora autônoma.
O DIARINHO já vinha num processo de profissionalização, que começou quando ele fez 15 anos. Naquela época o Dalmo estava vivo e atuante, e era um anseio dele fazer com que a redação do DIARINHO ficasse mais profissional. Como foi este processo? Eu comecei a fazer jornalismo, comecei a trabalhar na redação e comecei a coordenar a equipe editorial. Naquele momento eu achei importante a gente contratar pessoas que trabalhassem nessa área, que estudaram jornalismo, que tinham essa prática do dia-a-dia numa redação. Naquela época, foi uma mudança feita em conjunto com o Dalmo. Ele também achava isso importante. Ele viu que a empresa dele estava crescendo e para isso precisava se profissionalizar. Há cerca de 15 anos começou essa profissionalização do DIARINHO, que agora chegou neste patamar. Eu vejo hoje a redação muito profissional. E isso é importante, pois mesmo que nós tenhamos uma maneira particular de linguagem, que nós tenhamos uma maneira bem humorada de escrever, o que fazemos aqui é jornalismo. Jornalismo com boa apuração, com ética, enfim, com responsabilidade. É um jornal sério na maneira de apurar as notícias e bem humorado na hora de contá-las.
Se houver um acidente com morte e houver uma pessoa envolvida que seja sua parente, você publicaria esta foto no jornal?
Francini Schmidt, 23 anos, cozinheira e estudante de gastronomia.
Sim. Amigos meus e até familiares já se envolveram em acidentes, não com morte, graças a Deus, mas que foram noticiados no jornal. Acho que a notícia, neste ponto, se sobressai ao laço familiar. Não acho que seja ofensivo noticiar uma coisa que aconteceu. A morte choca e emociona; ela é grotesca porque num acidente traz o elemento surpresa, além da dor que causa à família. Mas não vai ser menos doloroso se a gente deixar de falar naquele assunto. Isso é jornalismo. A gente contar para as pessoas o que aconteceu, mesmo que seja muito triste e desagradável. Esta é a nossa obrigação.
Por que o DIARINHO não passa mais nos pontos de táxi pra saber as informações? A gente está aqui 24 horas e sempre tem alguma notícia. Assalto mesmo sempre acontece...
Orli Antônio Pacheco, 62 anos, taxista.
Olha, eu desconheço essa prática de passarmos em pontos de táxi atrás de informação. Talvez isso fosse uma sacada de um bom repórter nosso, que tivesse nos taxistas uma fonte de pautas. Acho interessante a sugestão porque, realmente, os taxistas andam por toda a região, e sempre serão uma fonte constante de informação. [Qual a principal fonte de informação do DIARINHO ?] Hoje a gente tem uma facilidade, pois podemos dizer que a notícia nos procura. Acontece algo e as pessoas logo associam: “ah, vou ligar pro DIARINHO.” Isso foi uma coisa que a gente conquistou. Hoje é mais fácil fazer o DIARINHO do que era há muitos anos atrás. Primeiro, porque antes não tinha internet, telefone celular, não tinha computador, câmera digital. Enfim, uma série de facilidades tecnológicas. Além dessas facilidades, hoje a gente tem um grande parceiro, que é o leitor. As pessoas associam: fui mal atendido, vi um acidente, um assalto, estou sabendo de uma denúncia, então vou ligar para o DIARINHO. O jornal é uma instituição da cidade. Um prestador de serviços e uma tribuna para os leitores, que sabem que o DIARINHO está aí para isso. Cobro dos nossos jornalistas que, para se manter informado, tem que ficar sempre muito atento nesta relação com o leitor. Tem que atender todos os telefonemas, ler todos os e-mails, atender às pessoas que vem aqui pessoalmente. Nem sempre tudo vai render uma boa matéria. Mas é nossa obrigação atender e ouvir a todos, filtrando o que é notícia e o que não é. Também é obrigação do jornalista visitar delegacias, a prefeitura, a câmara, enfim, sair às ruas, passar pelos botecos, pela praia, ir onde estão as pessoas. [Como que o leitor sabe se a sua ligação surtiu efeito?] O leitor quer que a sua denúncia seja a manchete do jornal, claro. Mas nem sempre isso é possível. Então, se ele for bem atendido, se ele for ouvido, estamos cumprindo o compromisso que temos com ele. Isso é uma coisa que é delicada, mas que é determinante: quem faz o jornal é o jornalista, o profissional. O jornal não pode ser feito pelo leitor. O leitor é uma fonte de informação, mas nem sempre o que ele acha que é matéria, tem mesmo interesse jornalístico. Primeiro porque seria um jornal de “700 páginas”, se fôssemos utilizar todas as informações trazidas pelo leitor. Por isso, essa relação tem que ser bem delineada: o leitor vai trazer o que ele acha interessante e o jornalista vai decidir o que é fato jornalístico, o que pode virar notícia. E o leitor sempre tem ainda à disposição a sua seção no jornal, que é a de Cartas. No DIARINHO temos ainda uma outra editoria que está diretamente ligada ao leitor: a Voz e Vez do Povo. Lá o ponto de vista do leitor se sobressai, dá o tom das matérias publicadas.
O jornal publica matérias com imagens de bandidos. Vocês não têm medo de serem ameaçados?
Ednéia Benavenuta Celestino Custódio, 35 anos, comerciante.
Medo a gente tem, mas precisa continuar trabalhando. Mas uma coisa precisa ser dita também, se fôssemos fazer um resgate, contabilizando as ameaças que sofremos ao longo desses 30 anos, veríamos que a maioria das pessoas que nos ameaçou não era bandido. Ao menos não era bandido no sentido literal da palavra: condenado por assalto, assassinato, estupro, enfim. As pessoas que, geralmente, têm este tipo de reação, de ameaçar o jornalista, o jornal, tem outro perfil. [Quem são?] Buscando em nossos arquivos, vemos que a maioria das ameaças veio de políticos, de empresários, de policiais, e até de funcionários públicos que, em algum momento, não gostaram de ser criticados pelo DIARINHO, e resolveram apelar. A reação dessas pessoas, ao contrário da esperada, que seria exercer o direito de resposta e, se fosse o caso, entrar na justiça pedindo a reparação do dano, foi a mais primitiva possível. Ameaçar, xingar, tentar intimidar. [Teve caso de agressão física?] Teve. Eu nunca sofri nenhuma agressão física, mas já vi desequilibrado invadir o jornal para quebrar o que via pela frente. Mas já houve jornalista do DIARINHO que levou cintada, soco, tapa, enfim, que sofreu violência física mesmo.
O jornal é crítico e aborda a criminalidade sem medo. As denúncias contra criminosos, sejam bandidos, policiais ou políticos, de uma forma geral, acontecem bastante. Onde você encontra coragem e força para não estremecer e nem voltar atrás?
Jorli Maximo, 27 anos,motorista.
O jornal sair às bancas, todos os dias, já é um tônico revigorante enorme, para quem gosta de trabalhar com jornalismo. Sair nas ruas, logo cedinho, e ver o leitor com o DIARINHO embaixo do braço, comentando, sugerindo novas pautas...Ver os anunciantes preferindo o nosso caderno de classificados, o telefone aqui da redação tocando sem parar, tudo isso dá coragem. O fato de as pessoas terem o DIARINHO como uma instituição da cidade, também dá a certeza de que você está no caminho certo, que não dá pra temer nada e nem voltar atrás. Falo isso como jornalista que sou. E falando como empresária, também considero importante ter serenidade para constatar que cumpro a minha obrigação: a minha empresa emprega muitas pessoas, paga salários e impostos em dia. Coordeno uma equipe que faz o melhor que pode, que trabalha com dedicação, responsabilidade e com amor à camisa. O DIARINHO, que é um jornal pequeno se comparado aos grandes, e é enorme se comparado aos concorrentes menores, vem trilhando o seu caminho há 30 anos, e com muito sucesso. Este conjunto faz com que eu não tenha medo de seguir em frente.
Quem lê as manchetes e vê algumas das fotos do DIARINHO fica com a impressão de que "vale tudo" no jornal. É isso mesmo? Qual o limite editorial do DIARINHO? E no papel de editora/diretora/dona do jornal, como é dar esse limite?
Alexandre Gonçalves, 35 anos, jornalista.
O limite da notícia é a verdade. A gente não faz ficção. Quando existe um fato, foi bem apurado, então é notícia e pode ir para as nossas páginas. Seja um grande crime, uma denúncia de corrupção, uma reclamação. Não tem nenhum tipo de purismo: ‘ah, isso é feio, ah isso é triste, então a gente não fala.’ Funciona assim: aconteceu mesmo, tem interesse jornalístico, foi bem apurado, foram ouvidas as pessoas envolvidas? Então é matéria!
Eu conheço o DIARINHO desde o seu início e gostaria de saber se você projetava dar essa continuidade ao jornal? Você conseguiu profissionalizar o jornal e dar continuidade a linguagem proposta pelo seu avô. Como conseguiu isso?
Osmar de Souza Nunes Filho, 57 anos, comerciante.
Estamos fazendo um resgate de todas as nossas edições para o caderno de 30 anos do DIARINHO. Apareceu numa certa edição, uma declaração do meu avô, quando eu tinha três anos, dizendo que eu seria a futura diretora do jornal. Naquele momento eu não sabia disso e nem aspirava nada, pois era uma menininha. Mas fiquei feliz quando vi isso recentemente, porque tive, mais uma vez, a certeza de que sou muito realizada. Primeiro, porque faço o que gosto, e em segundo porque realizei o sonho do meu avo de dar continuidade ao jornal dele.
Eu comecei a trabalhar no DIARINHO quando tinha 16 anos. Naquele momento, eu queria apenas trabalhar, ganhar meu próprio dinheiro. Eu era uma adolescente, e não imaginava: “ah, eu vou ser a futura editora do DIARINHO.” Comecei atendendo ao telefone, indo ao banco, atendendo às pessoas que chegavam ao balcão. Como eu sempre gostei de ler e escrever, era uma boa aluna de português, resolvi fazer jornalismo. Quando passei no vestibular o meu avô falou: “ah, então tá, agora tu vai trabalhar na redação”. Naquela época não tinha nenhum jornalista formado no DIARINHO. Eu fui ser estagiária de jornalismo. Comecei fazendo polícia, indo nas delegacias, fazendo foto de buraco na rua. Naquela época, o DIARINHO era muito diferente do que é hoje, a estrutura da redação era muito precária. Não tinha essa separação de editorias, todo mundo fazia alguma coisa. Tirava foto, atendia o leitor, ia à delegacia, entrevistava, redigia texto, revisava as matérias, enfim, se fazia de tudo. E eu gostei quando comecei a trabalhar com edição. Quando planejava a edição do dia seguinte. Gostava de corrigir os textos, de escolher as fotos, de revisar as páginas, de fazer a capa.
Me envolvi no processo de edição e deu o estalo: “é isso que quero fazer, me achei no jornalismo.” Não fui nomeada nunca “chefe”, mas fui ficando e ocupando o espaço de editora geral. Meu avô foi cuidando mais da parte administrativa e deixou que a redação pra eu tocar. Foi assim durante muitos anos, até ele morrer. Quando o Dalmo morreu eu tive que me inteirar da parte administrativa. Hoje, quando estou prestes a completar 15 anos de DIARINHO, estou ligada nas duas pontas: na parte administrativa e na redação. Elas são, de certa forma, o oposto uma da outra. Por eu vivenciar esses dois lados da moeda, é mais fácil de eu ser sensível aos anseios dos dois lados. A parte administrativa quer que a empresa dê lucro, sempre. A redação quer sempre contratar mais gente, aumentar o número de páginas, mais equipamentos, melhores salários. Este tem sido o meu grande lance: como fazer a empresa ser enxuta e saudável para pagar as contas em dia e como garantir que a redação seja bem equipada, estruturada, para fazer um DIARINHO cada vez melhor? É preciso um equilíbrio, como tudo na vida, aliás.
Está dando certo também, graças a equipe bacana que eu formei. Eu aprendi uma coisa que o meu avô teve dificuldade a vida inteira para fazer: a delegar. O Dalmo, no final da vida, estava, finalmente, conseguindo delegar funções, mas foi por um período curto. Quando ele achou que ia tirar férias permanentes do DIARINHO, ele morreu. Uma pena que ele não tenha podido aproveitar mais. Ele trabalhou muito e gozou pouco o que construiu.
Mas era o jeito dele. E, hoje, fazendo uma análise do que aconteceu, acho que a dificuldade que ele tinha de delegar, de profissionalizar a administração do DIARINHO, atrasou um pouco a nossa evolução como empresa. Eu não sou administradora, mas tento tocar o DIARINHO com essa percepção: de que a gestão tem que ser profissional em cada setor. Apesar de eu estar todos os dias aqui e a palavra final ser a minha, eu ouço muito as pessoas que estão trabalhando comigo. Para que a equipe seja ágil, dinâmica, unida e responsável. [Qual foi o maior desafio depois que ele morreu?] Tocar a parte administrativa, pois até então a redação era a minha ‘praia’. Eu continuei fazendo o que eu sabia fazer: jornalismo, e mergulhei de cabeça na gestão da empresa. Meu avô saiu pra viajar, falou que voltava em 30 dias. Naqueles 30 dias eu fiquei administrando a empresa, mas esperando que ele voltasse em 30 dias. Quando ele morreu, eu pensei: “Meu Deus, agora ele não vai voltar nunca mais.” Então eu me dei conta da realidade: tinha que pagar os funcionários por aqueles dias, tinha uma série de contas, contratos vencendo, negociações com anunciantes, etc. Tomei decisões, o que pagava primeiro, o que ficava pra depois. Tive que me inteirar do que havia em caixa, quais eram as expectativas de receita, quais seriam as despesas. Foi grande susto, mas em nenhum momento eu achei que teria que resolver tudo sozinha. Eu contratei uma equipe bacana, jurídica e contábil. Essas pessoas souberam me apontar caminhos e eu fiz escolhas. Já faz quase cinco anos que ele se foi e foi tudo se concretizando sem traumas. Apesar de ele ter morrido repentinamente, a gente nunca atrasou o pagamento dos funcionários. O DIARINHO não parou de circulam nem um dia. As coisas continuaram como se ele tivesse na casa dele no Morro da Cruz, que era de onde ele dava as ordens nos últimos anos. Ele se comunicava muito por e-mail, telefone, pó bilhete. Já não havia muito a presença física dele, mas era sempre o Dalmo quem dava a última palavra.
Qual a influência da administração voltada para resultados e metas dentro do jornalismo?
Alexandre G. Rocha, 37 anos, diretor executivo.
Se tu fores traçar como meta o lucro, puro e simples, fica complicado. Aqui no DIARINHO não funciona assim. Se me perguntarem o que tenho como meta para 2009, responderia que gostaria de contratar mais alguns profissionais, lançar novos cadernos, aumentar a tiragem, e além disso pagar as contas em dias. As metas que eu traço para o DIARINHO são para estruturá-lo como a empresa que quero ser. De maneira alguma eu faço isso através de números. Eu quero lucro, claro, que é a razão de ser de qualquer empresa. Mas ele não é uma fábrica de sabonetes. Eu quero estruturar o DIARINHO como jornal. Se ele for cada vez mais independente financeiramente, ele também será cada vez mais livre editorialmente.
Se eu for pensar hoje quem são os nossos concorrentes... A gente tem uma dupla concorrência, que de certa forma é desleal. A gente não pode concorrer de igual para igual com os grandes veículos, das grandes redes de comunicação. É impossível fazer com que seja natural, por exemplo, concorrer com a RBS. Não é, nem nunca vai ser, porque não estamos ligados a um grande grupo. E também não posso competir com os veículos pequenos, porque eles não têm uma redação e uma estrutura com o custo que eu tenho. Muitas vezes a RBS vai assediar o anunciante oferecendo venda casada em seus vários jornais, coisas que eu não posso fazer. E o pequeno jornal vai cobrar a metade do que eu cobro pelo anúncio, porque o jornal dele é feito por duas pessoas, com uma tiragem ridícula. Mas na hora da briga pelos anúncios eu tenho que enfrentar o jornal do picareta que finge que faz jornalismo e também o mega-jornalzão da RBS, que pode botar o preço lá embaixo, porque quem sustenta o jornal deles é a TV do grupo.
Como funciona o departamento jurídico do DIARINHO? O jornal sofre várias ações judiciais. Há mesmo esse grande número de processos e quantas condenações o jornal já sofreu?
Alexsander Bernardes de Souza, 26 anos, funcionário público estadual.
O jornal sofreu dezenas de condenações e ele também foi absolvido em dezenas de processos. Teve uma época em que ele foi mais processado, que foi na década de 90, porque ele teve uma postura mais agressiva naquele momento. Hoje, a gente tem o departamento jurídico, que é encampado pelo doutor Fábio Fabeni. Somos muito responsáveis na apuração e na redação dos textos. Porque a administração da empresa é responsável. Não tem como a gente ser leviano num texto e correr o risco de sofrer uma condenação criminal e cível, ter que pagar indenização e etc. A gente observa o que é permitido e faz o nosso trabalho da melhor maneira possível.
Algumas condenações eu considero injustas, mas determinação judicial a gente cumpre e não debate. A indústria do dano moral atinge a imprensa como um todo, mas de forma mais dura as pequenas empresas de comunicação. Porque pra Veja, pra Folha de São Paulo uma condenação de 30, 40 mil reais não significa nada, mas pro DIARINHO significa ter que tirar do caixa um dinheiro que não temos. Daí teremos que conter despesas, diminuindo o numero de páginas, ou demitindo algumas pessoas.
As pessoas que trabalham hoje no DIARINHO têm que ter essa consciência e essa responsabilidade. O leitor pode dizer: “ah, mas antigamente vocês falavam filha da puta e hoje vocês não falam...”. A orientação é que não façamos. A gente faz da maneira que é previsto pelo nosso departamento jurídico, é um cuidado que a gente precisa ter para sobreviver.
O que rende uma boa manchete no DIARINHO?
Alexandre Gonçalves, 35 anos, jornalista.
Uma boa história. Tem muita gente que diz que o DIARINHO é um jornal policial. Não é verdade. Talvez em várias edições a melhor história tenha sido uma de polícia. Mas eu já fiz manchetes muito bacanas falando de esportes, de variedades, de prestação de serviço, de uma reclamação. O que rende uma boa manchete é uma história interessante. Daí o leitor vai passar na banca, vai ver o jornal e dizer: “Eu quero ler, eu quero saber o que aconteceu”. Então uma boa manchete vem de uma história bem apurada e bem contada. E a boa manchete vem de um fato jornalístico, obviamente [risos]. A gente não trabalha com ficção. Existem boa histórias de ficção também, mas essas não servem para um jornal.
O mercado vê o DIARINHO como um jornal sensacionalista ou como um jornal independente? Que mercado o DIARINHO quer atingir? E, comercialmente, qual o preço da independência?
Alexandre Gonçalves, 35 anos, jornalista.
O mercado publicitário enxerga o DIARINHO da maneira que o mercado enxerga as coisas: a realista. O mercado é muito inteligente. Os anunciantes vêem que o que eles anunciam no DIARINHO vende. Pra eles, então, pouco importa classificar o DIARINHO de sensacionalista, ou de popular, ou de qualquer rótulo. “Eu anunciei, vou vender e vou ter lucro”. Essa é a maneira que o mercado encara o DIARINHO. Se você me perguntar como os teóricos da comunicação vêem o DIARINHO... Aí direi que alguns têm uma visão crítica. Eu acho legal a crítica que vem da academia, da universidade. Faz mais rico o nosso trabalho. Mas desde que essa crítica tenha fundamento. Quando a pessoa analisa o que fazemos, pensa diferente daquilo e nos critica é interessante. Mas quando a crítica é gratuita, preconceituosa, ela é burra. Como que alguém que diz que não lê o DIARINHO pode condená-lo? Pra mim não interessa o que essa gente pensa do nosso trabalho. “Ah, o DIARINHO é um jornal sanguinário, então eu não leio. O DIARINHO tem uma linguagem vulgar então não entra na minha casa”. Mas fala da boca pra fora, porque não acompanha o dia-a-dia e nem sabe da evolução que o jornal sofreu. Eu faço um desafio! Pra qualquer pessoa, seja da classe social que for. Seja operário, industrial, professor, comerciante ou doutor. Quem vive na nossa região e ler o DIARINHO durante 30 dias seguidos, vai lê-lo para sempre. Ele vicia! Porque ele é altamente informativo, é um prestador de serviços nato, é esteticamente bonito e atrativo, tem uma linguagem agradável, é polêmico, divertido, enfim, um jornal que tem muito ‘sal’. Quem lê o DIARINHO durante 30 dias se vicia! Porque, modéstia à parte, ele é um puta jornal. [risos]. [E qual é o preço da independência?] O preço da independência é não ter medo de cara feia. Às vezes cara feia dos teus próprios colegas da imprensa, que tem uma visão preconceituosa do teu trabalho. Não ter medo da cara feia das autoridades, que adoram o DIARINHO até serem criticadas por ele. Não ter medo da crítica da academia, mesmo porque a maioria dos teóricos jamais trabalhou e nem tem pique ou competência para trabalhar em jornal. O preço da independência é não ter medo de enfrentamento e nem de sofrer pressão. [E comercialmente qual o preço da independência?] Às vezes você pode perder um anunciante ou perder um contrato com uma prefeitura ou com o governo do Estado, porque eles não aceitam ser criticados. O Dalmo sempre dizia: “Liberdade de imprensa não existe pra quem dá pau, só pra quem puxa o saco”. Querem que a gente passe a mão na cabeça deles. Eles não admitem a crítica, não admitem o jornalismo que critique. Daí vão revidar cortando anúncios, xingando o jornal, ameaçando e muitas vezes te processando.
Mas vale a pena pagar o preço. O DIARINHO, mantendo essa postura independente, continua sendo o mais lido, e sendo o mais lido, os anunciantes, o mercado, continua anunciando em suas páginas. Por isso digo que o mercado é inteligente, ele sabe onde anunciar para ter resultado. E são os leitores e os anunciantes que mantêm o DIARINHO independente. Esse é o círculo ‘virtuoso’ que faz com que as coisas dêem certo.
Qual o maior furo jornalístico dos 30 anos de DIARINHO?
Marco Aurélio Seara, 50 anos, engenheiro eletricista
Ah, foram vários. Um furo jornalístico recente e bastante polêmico foi quando a gente anunciou que a prisão preventiva do ex-prefeito Volnei tinha sido pedida por um Procurador da República. Estava em segredo de justiça, queriam esconder por causa da eleição. O DIARINHO foi atrás, apurou e teve coragem de publicar porque era um baita furo jornalístico. Um procurador da república pediu a prisão preventiva do prefeito. “Ah, tá! Mas um desembargador entendeu que não deveria pedir”. Sim, isso também tava lá na matéria também – a leitura que o procurador e o desembargador fizeram do suposto envolvimento do prefeito naquela investigação policial. Nós furamos toda a imprensa. Só depois que o DIARINHO noticiou, os outros veículos noticiaram. Aliás, todos os grandes jornais publicaram a matéria depois, inclusive os do eixo Rio/ São Paulo. Apesar da polêmica que o episódio causou, a gente fez o certo. Fizemos nosso papel de contar a história! Muita gente achou que não deveríamos publicar em função do processo eleitoral. Mas é o contrário. As pessoas tinham o direito de saber da investigação. O que não pode é o processo eleitoral privar o direito soberano das pessoas serem bem informadas.... Houve outros grandes furos: o esquema de venda de carteiras de motorista que funcionava dentro da delegacia, por exemplo. Na edição desta quarta-feira passada mesmo, mais um furo: flagramos a polícia militar liberando ladrões atacando carros dentro do pátio de veículos apreendidos de Itajaí.
Qual foi a matéria mais difícil de fazer nesses 30 anos de DIARINHO?
Jaqueline dos Santos Pereira, 25, auxiliar de cabeleireiro.
A morte do meu avô, com toda a certeza. Pra mim foi a mais dolorida. Naquele dia, eu acordei com a notícia de que ele tinha morrido em Barcelona e, depois de chorar e de ficar algumas horas em estado de choque, eu pensei: “Amanhã vai ter que sair o DIARINHO, e sou eu quem vai coordenar esta edição”. Eu fiz o editorial daquele dia, e foi o mais difícil de fazer, porque era um adeus ao meu avô e ao homem com quem eu trabalhei durante muitos e muitos anos. Era meu avo, meu patrão e meu colega de trabalho. Foi a edição mais sofrida da minha vida. Mas é também uma edição que, sempre que eu vejo, me emociona. Foi feita com o coração, mas muito bem planejada, redigida e diagramada. Ficou linda. É um documento histórico.
Queria saber quantas pessoas trabalham no DIARINHO hoje? E quando começou o jornal quantas pessoas trabalhavam?
Roger Max Moreira, 12 anos, estudante.
Hoje, arredondando o número, a gente tem praticamente 100 funcionários. Se for contar os colaboradores dá umas 120, 130 pessoas. Sempre me surpreendo com a quantidade de funcionários nas festas de fim de ano. Tem gente que trabalha na mesma empresa e nem se conhece (risos).
Quando começou, era o Dalmo, o João, e mais duas ou três pessoas. Era feito artesanalmente o DIARINHO. Impressiona o quanto cresceu. Hoje é tanta gente pra fazer esse mesmo jornal...
Mas é o mesmo jornal e não é, porque temos que considerar a evolução, o quanto ele ficou grande. A equipe é numerosa, mas não tem ninguém ocioso. Todas as pessoas que estão aqui trabalham muito. Se nós fôssemos ligados à uma grande rede de comunicação, com certeza haveria muito mais gente fazendo este mesmo jornal. A equipe é enxuta para fazer tantas páginas, cobrir tantas cidades.... A gente faz mágica, digamos assim.
Quais são os planos do DIARINHO para a região de Florianópolis. Além da capa, há projetos para aumentar o números de páginas para a região? Há planos de tornar o DIARINHO estadual?
Hélio Costa, 50 anos, apresentador.
Eu não tenho um plano específico de crescimento pra Florianópolis. A minha intenção é que o DIARINHO cresça de uma maneira geral. Que ele circule mais nas cidades do litoral norte catarinense. Acho que é difícil o DIARINHO, com a linguagem que ele tem hoje, ser um sucesso em todo o estado. O estado de Santa Catarina é muito dividido por regiões. O sucesso do DIARINHO está muito ligado ao fato de ele ter uma linguagem específica para se comunicar com essa faixa de litoral. Em Florianópolis é importante a nossa circulação não só por ser a capital, mas porque o manezinho é muito parecido com o pessoal daqui, com o dengo-dengo, com o peixeiro, com o papa-marisco, o papa-siri. A gente é muito uniforme, no litoral, nessa questão cultural. Pro DIARINHO crescer estadualmente ele teria que ter alguns ajustes. Talvez fazer cadernos segmentados. Ele teria que falar a linguagem dessas pessoas do interior. Outras expressões, outra maneira de viver a vida. Hoje é difícil falar uma linguagem universal para todo o estado de Santa Catarina. Todos os jornais estaduais são de mentirinha. Porque não tem nenhum jornal estadual que fale a linguagem de todos os catarinenses. Esses jornais não conseguem se fazer estaduais. O itajaiense, por exemplo, acaba não lendo o jornal estadual porque ele não consegue ser ver ali. O jornal não fala do problema da rua, do bairro. Entre ler esse jornal estadual e ler o DIARINHO o itajaiense acaba preferindo o DIARINHO. Temos que tomar cuidado com esse crescimento pra não cometer o mesmo erro: querer falar com todo mundo ao mesmo tempo e acabar não falando de maneira concreta com ninguém.
De que forma a experiência com o blog DIARINHO na Chuva está influenciando ou vai influenciar no projeto do novo site do jornal? O que o jornal tirou como lição da experiência?
Alexandre Gonçalves, 35 anos, jornalista.
Qualquer crescimento que se imagine para o jornal, ignorando a internet, seria uma burrice. A internet, apesar de eu não acreditar que o jornal de papel vá acabar, agrega valor ao jornal impresso. O blog mostrou o quanto é imediata essa relação on line com o leitor. A gente trabalha o dia inteiro para amanhã colocar o jornal na rua e as pessoas o lerem. Na internet, em questão de cinco minutos, tu tens uma resposta do leitor. Ele já leu a tua mensagem, já te deu o retorno.
Ficou uma experiência muito positiva pelo número de acessos naquele momento delicado que foi a enchente, quando a gente tinha dificuldade de sair às ruas. Não porque a gente não conseguisse fazer o jornal, mas porque a gente não conseguia circular. A cidade estava embaixo d’água. Os entregadores estavam com problemas, não conseguiam vir trabalhar. A idéia do blog foi muito feliz. A gente conseguiu passar informação. Claro que o leitor da internet não é o mesmo da versão impressa. Isso é uma sacada a mais que a gente tem que ter: as pessoas que lêem o DIARINHO impresso não são as mesmas que o lêem na internet. O nosso site peca hoje por isso, pela falta de imediatismo. A gente pega toda a edição impressa e coloca o conteúdo na internet. Estamos revendo isso, porque a intenção é usar a agilidade da internet para aperfeiçoar a nossa comunicação com o leitor.
Tio Cesar se mudou-se!
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Como toda mudança, as coisas acabaram sendo feitas meio de última hora e
pela metade. A kombi que ia levar os móveis quebrou, a camionete com as
louças ext...
Há 15 anos